terça-feira, maio 22, 2007

Dançando!

Dança comigo, abraçando-me e colando o teu corpo no meu, despertando a sensualidade e o instinto de ambos, permitindo que sejamos um só, um no outro e onde a harmonia dá lugar ao entendimento...
Cada porção do teu corpo aninha-se em mim, tocando-me e entrelaçando-se como puro magnetismo e embora seja apenas algo físico, a envolvência que de nós se apodera, faz-nos transportar para lá do simples ritmo que nos move. Sempre que dançamos, deslizamos como água num curso fluente, directo, organizado e sempre com o desejo de um desaguar perfeito, estrondoso e arrebatador. Fico perplexo, possuído e envolto por uma aura divina quando te sinto por mim, com o desenrolar do teu saber, da tua agilidade e mestria... Acaba por ser um sentido, um rumo, um trajecto, um consumir e um esbanjar de energia, um cansaço apetecível de prazer e objectivo. Sentimos demais, queremos mais, vivendo para além do possível, desafiando a física, ousando os limites de um corpo já por si trabalhado em prol de um sorriso, de uma satisfação e de um bem estar único e inexplicável.
Para todo o sempre, seremos eternos enamorados de uma paixão onde o verdadeiro amor não está em nós, mas sim no que permitimos sentir por entre nós. Mais do que uma coreografia de movimentos aliados a ritmos de melodia, está sem dúvida a paixão que por ela temos...
Abraça-me! Dança comigo!

sexta-feira, maio 18, 2007

Pavios!

Na tarde mais distante de um dia tardio, esperava que a vida nascesse, amasse e findasse, vivendo de um sono calmo, secreto e tranquilo, espreguiçando a saudade e os pesadelos que morriam de difícil verdade e complexo sentido...
O olhar enternecido pelo lamento, atrasado no beijo de um suspiro retardante, sugava-me o foco de uma luz fraca de aparência e palpitar cambaleante, desunido no ardor do momento e aguardando por um tempo que por pouco vestia, unido na comunhão de um prazo, que lentamenta sufoca e aos poucos, contagia...
Mantendo no luar o sol de um calor iluminado, absorvo a alquimia desta estranha magia, casando as estrelas com os astros em completa harmonia, vivendo de feixes de verdade, tal qual uma vida, abandonando o pó e as impurezas gastas, por longos ventos de investida. Casando noite com o dia, na mais bela aura do sentimento, adormecendo silêncios nocturnos, com soturnos momentos, vivendo cruzado de aromas e cheiros de um ar consumido, nascido e usado por força de um sopro corroído...
Sinto os instantes, ardendo no fogo que a madeira consome, virado do avesso, como um mundo azíago de miséria e fome, doendo de um ardor perfurante e gasto pela sorte, onde a noite se veste, escurece e aos poucos se absorve...
Que a tarde distante do meu dia tardio, alimente a manhã da minha noite e a noite do meu dia, consumindo a madrugada tal como um pavio, onde me acabo, termino e facilmente me findo...

terça-feira, maio 08, 2007

Retiros!

Gosto do teu espaço, do teu aprumo, do teu recanto...
Daqui, observam-se os telhados gastos pelo tempo, as imagens escurecidas por uma densa manhã de nevoeiro e uma singela neblina que nos engole e deprime. Sabe bem estar sentado neste soalho de tábuas largas, ter diante de nós uma cidade que lá em baixo se move, se muta e aos poucos consome o tempo de mais um dia em que a realidade pouco ou nada se altera. Colo a minha testa no vidro da enorme janela de madeira que me separa das ruas, das vielas e dos imensos recantos desta paisagem urbana. Ao longe, o rio parece sereno, tranquilo e estranhamente acomodado. Encosto a nuca na parede, chegando para mim os joelhos, abraçando-os e deixando-me ficar encolhido numa posição extremamente agradável. Olho para o tecto da casa, imaginando o que cada pedaço de pedra, de areia, de cal e de madeira, me poderiam dizer caso falassem. Os séculos que passaram, deixaram as marcas de um tempo infindável e a vontade de libertar tudo aquilo que por aqui viveram. O cheiro adocicado e lúgubre das casas antigas agrada-me, conforta-me e confere-me uma enorme sensação de segurança. Apesar da sua debilidade natural, as imponentes fachadas dos edifícios antigos são a principal razão para me sentir seguro neles, como que amedrontando a física através do seu aspecto resistente. Gosto do sossego que aqui encontro, da paz destas divisões e até mesmo da escadaria em madeira que treme e soluça a cada passo. Encontro a felicidade quando aqui venho, quando tenho as chaves deste minúsculo retiro e me permito fazer dele, o meu lugar de meditação, de bem estar e prazer. Sabe bem ver que nem tudo é mudança, que nem tudo é remodelado ou destruído e que à semelhança de um qualquer objecto dos nossos avós, também aqui se consegue estar e usufruir deste espaço com o mesmo cuidado com que estimaríamos a mais bela preciosidade. Sabe bem esta nostalgia, este sentir, esta saudade que apenas nos recorda a infância, embora tudo permaneça intacto e da mesma forma. Aliás, a única alteração terá sido nós mesmos... A beleza intrínseca da paisagem interior e exterior, nem se moldou sequer aos tempos modernos, mantendo por isso a mesma talha artesanal, os mesmos traços de antiguidade e a mesma postura ao nível do horizonte. Fecho os olhos... Procuro os sons perfeitos, os cheiros equilibrados para tudo isto, os sabores que por aqui preencheram as línguas sequiosas e que tantas vezes lhes terá servido de alimento... Aqui viveram pessoas, aqui se criaram crianças, aqui muitos se terão tornado homens e mulheres, e até aqui, muitos terão partido para o encontro divino com a vida eterna. Será talvez e tão somente um singelo edifício, um simples prédio antigo da minha cidade, mas mais importante que isso, é o encontro que aqui vou mantendo e a bonita sensação de, por breves instantes, pensar que consegui parar o tempo e aqui lhe falar.